domingo, 18 de novembro de 2018

Mais Médicos: o Vício de Origem

Mais um post da série sobre o programa "Mais Médicos".

O grande problema no programa é o que eu chamo de vício de origem. Uma reportagem do Jornal da Band de título "Acordo com Cuba foi mascarado" (veja aqui) mostra que membros do Ministérios da Saúde e da OPAS (Organização Pan-Americana da Saúde) conheciam as principais controvérsias sobre o programa. Mas ao invés de trabalhar para resolvê-las, atuaram para ocultá-las, para enganar o Congresso, a Justiça e a sociedade brasileira.

O episódio, no mínimo, tira a credibilidade dos envolvidos para negociar os termos do acordo.

A seguir abordamos essas controvérsias, destacando os trechos da gravação que mostram a preocupação do grupo de mascarar os problemas ao invés de solucioná-los:

a) Controvérsia: o programa tem um viés ideológico com o objetivo de financiar a ditadura de Cuba

O grupo discute como ocultar o fato de que na verdade o programa se tratava de um acordo bilateral entre Brasil e Cuba, o que o obrigaria a ser discutido com o Congresso. Para evitar isso o nome de Cuba não podia aparecer de forma explícita no programa. Além disso, a contratação de médicos de outros países, em número ínfimo, aparecia apenas para ocultar o fato de que o programa visava de fato a contratação do médicos de Cuba.

Não é dito na gravação, mas a própria intermediação da contratação via a OPAS poderia ser parte dessa estratégia de dizer que o contrato não era, de fato, entre Brasil e Cuba.

"Se a gente coloca 'governo cubano', se o nosso documento é público, qualquer pessoa vai entender que a gente tá driblando a coisa de fazer o acordo bilateral e pode dar uma detonada nisso"

"Eu posso colocar atividades do Mercosul e da Unasul, que vai dar dois milhões.  Dois milhões (de reais) em relação a um bilhão e seiscentos milhões (de reais), será que na coisa da justiça tem problema?”

[20/11/2018] Apenas dois dias após esse post, uma reportagem da Folha de São Paulo tendo como base telegramas entre as embaixadas brasileiras e cubanas corrobora a hipótese de que a intermediação da OPAS teria feito parte de uma estratégia para ocultar que o contrato, de fato, entre os governos de Brasil e Cuba, veja aqui.

b) Controvérsia: o programa não teria médicos de verdade. O programa teria "agentes" infiltrados para vigiar os médicos cubanos.

À primeira vista, tal proposição soa como um "Fake News". Mas, incrivelmente, essa suspeita começa a fazer sentido diante de um trecho que mostra a intenção de ocultar que entre os médicos havia assessores. Provavelmente Cuba impunha a vinda desses assessores.

“Eu vou colocar, tipo assim, se são nove mil médicos e 50 assessores, eu vou colocar 9.050 médicos bolsistas no meu T.A. (Termo de Ajuste), porque no programa não entra e é isso que eu quero defender.

c) Controvérsia: o percentual do salário pago aos médicos cubanos.

A gravação mostra que era possível se negociar esse percentual de forma a beneficiar mais os médicos cubanos e evitar problemas com a justiça brasileira. Mas aparentemente o percentual só foi discutido entre  Marco Aurélio Garcia, assessor da presidência, e o governo cubano:

“Sessenta (por cento) para o governo e 40 (por cento) para o médico. O Marco Aurélio (Garcia) botou isso na reunião, só para socializar.”

A participação de Marco Aurélio no episódio reforça as críticas de que a negociação privilegiou Cuba em detrimento dos médicos, já que ele foi um dos fundadores do Foro de São Paulo.

PS: Marco Aurélio ficou famoso por fazer um gesto obsceno ao saber da causa do acidente da TAM que vitimou 199 pessoas. O gesto foi interpretado como uma comemoração pela descoberta de uma falha técnica que isentaria o governo de responsabilidade no episódio.

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