domingo, 1 de maio de 2016

Senador Randolfe Rodrigues se engana sobre o impeachment de Temer

Essa semana me chamou a atenção a repercussão sobre o questionamento,  feito por Randolfe Rodrigues à Janaina Paschoal, na seção do Senado de 28 de abril,  sobre o suposto crime de responsabilidade de Michel Temer. De forma geral, o assunto foi mal esclarecido pela imprensa. O senador também divulgou a informação em seu facebook, mas com conclusões, na minha opinião, inexatas, como exponho a seguir.


No dia seguinte à discussão se propagaram na imprensa, blogs e youtube a ideia de que “Randolfe enganou Janaína Paschoal”. Veja por exemplo essa reportagem do Estadão. Segundo a reportagem, Janaína, enganada, “ficou constrangida e tentou se explicar”.

Em seu facebook, o senador Randolfe Rodrigues postou um vídeo sobre a discussão e comentou:  "Ontem questionei a autora do impeachment de Dilma sobre as mesmas ações praticadas pelo vice, então presidente em exercício, Michel Temer. Pela primeira vez ela afirmou se tratar de crime de responsabilidade também".

Mas o vídeo não está completo, não mostrando a tréplica de Janaína, o que induz a um entendimento errado dos fatos, já que só é apresentada a interpretação de Randolfe. Para ver a parte que faltou no vídeo do facebook de Randolfe, assista a discussão completa. A parte que não aprece no vídeo postado por Randolfe inicia-se aos 6 minutos:


Após assistir o vídeo, você concorda com a reportagem que diz que Janaína “ficou constrangida”? 

Analisemos agora a discussão detalhadamente. Randolfe inicia sua pergunta dizendo “O presidente da república assinou no exerci (gagueja) assinou entre novembro de 2014 e julho de 2015, 7 decretos que abriram créditos suplementares de 10,807 bilhões ...” e ressalta que quando assinados em 2015 não havia sido enviado ao congresso o projeto que reduzia a meta fiscal. 

Randolfe refere-se a Temer, mas acaba se expressando mal. Acho que ele queria dizer: “o vice-presidente da república assinou no exercício da presidência”. Mas omite o "vice" e gagueja, de modo que a frase fica truncada, de modo que não fica claro que estava falando de Temer. Veja que no facebook Randolfe escreve: “ações praticadas pelo vice, então presidente em exercício, Michel Temer”.

Janaína em sua resposta entende que Randolfe está perguntando dos decretos de Dilma. Isso fica claro quando ela afirma (3:06 do vídeo) “a presidente poderia ter cancelado”. Nesse momento Randolfe poderia ter esclarecido que ela tinha entendido errado a pergunta, mas não o faz. Aliás, é bem compreensível que Janaína não entenda a pergunta, já que ela não foi bem formulada e Janaína já está há 10 horas respondendo a questões sobre os mesmos assuntos, quase sempre sobre Dilma.

Mais tarde, Randolfe retoma a palavra, deixa claro que falava de Temer e conclui então que Janaína tinha “exposto as razões pelas quais seria necessário também pedir o impeachment de Temer". Faz ainda outras colocações, inclusive que Temer também deveria ser acusado de falsidade ideológica. Em seguida, Janaína retoma a palavra e, sem me parecer constrangida ou indignada, mas apenas cansada, diz que não é advogada de Temer, mas pondera que provavelmente ele assinou as medidas por delegação de Dilma e que os relatórios do TCU não o responsabilizam pelas pedaladas, mas que a soberania para decidir essas questões é do Senado.

Por delegação Janaína quer dizer que Temer só assinou os decretos a pedido de Dilma, já que ele, como vice, não tem autonomia para tomar uma decisão de bilhões à revelia da presidente. Normalmente é assim: decretos só chegam à mesa de um presidente após já terem sido amplamente discutidos com o presidente e sua equipe, quando só falta a assinatura, ou seja, a responsabilidade é do presidente, não do vice, que só estava substituindo o presidente momentaneamente.

Mesmo que considerássemos que Temer foi responsável por esses decretos (responsabilidade objetiva), ainda assim ele não poderia ser acusado de crime de responsabilidade, porque, quando eles foram assinados, a meta fiscal era de superávit, situação em que é permitida a edição de decretos suplementares. Já Dilma, assinou os decretos quando já havia um pedido de alteração da meta para déficit, fato utilizado no pedido de impeachment para justificar que foi cometido crime de responsabilidade.

Esclareço ainda a questão da falsidade ideológica. O pedido de impeachment acusa Dilma de falsidade ideológica porque as pedaladas fiscais (empréstimos de bancos públicos) não teriam sido contabilizadas: elas apareciam nos balanços dos bancos estatais, mas não no balanço do governo. Quer dizer, a questão de falsidade ideológica não tem nada a ver com os decretos de créditos suplementares.

Enfim, parece-me que Randolfe acaba por forçar a barra para tentar passar a ideia de que Janaína sancionou sua posição de que Temer também cometeu crime de responsabilidade. 

Um outro ponto: a posição de Randolfe é aparentemente contraditória: pelo seu raciocínio, Temer e Dilma cometeram crime de responsabilidade. Então porque ele declara para a imprensa que irá votar contra o pedido de impeachment? Seria o raciocínio do tipo: se Temer e Dilma cometeram crime de responsabilidade, então vamos deixar tudo como está?

Registra-se que em seu facebook Randolfe afirma que o vídeo não está completo pois "infelizmente" ele "não está salvo entre os vídeos do Senado", mas “estamos tentando conseguir”. Esperamos que ele tenha sucesso.

Logo a seguir, Randolfe comenta reportagem da Globo sobre sua discussão com Janaina, que teria sido parcial: "é o famoso jornalismo Globo".  Mas me parece que a reportagem da Globo leu melhor os fatos que Randolfe e a reportagem do Estadão. 

Cabe ao leitor com toda a informação aqui colhida julgar por si mesmo.

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