segunda-feira, 10 de outubro de 2016

O mito da proibição da prisão após a condenação em segunda instância

Estamos discutindo, ver aqui, a mudança em 2016 da jurisprudência do STF sobre a prisão após a condenação em segunda instância.

Eu, como provavelmente a maioria das pessoas, acreditava que no Brasil a Constituição de 1988 proibiu a prisão antes do trânsito em julgado. Mas isso não é verdade! Isso só foi verdade por 7 dos 28 anos de vigência da Constituição, graças a uma votação do STF em 2009 por 7 votos a 4!

Após a Constituição de 1988 a prisão após a condenação em segunda instância poderia acontecer e assim foi por mais de 20 anos. Por exemplo, em 2005, no julgamento do HC 85886, cuja relatora foi Ellen Gracie, foi mantida no STF por unanimidade uma decisão de 2ª. instância que determinou a prisão de um acusado:

“A sentença condenatória, mantida em segundo grau de jurisdição, sujeita-se à execução provisória (CPP, art. 637), independentemente do trânsito em julgado, porque os recursos eventualmente cabíveis – especial e extraordinário – não tem efeito suspensivo.”

Segundo trecho do voto de Ellen Gracie:


Afirmou ainda Ellen Gracie no julgamento do HC: 

“em país nenhum do mundo, depois de observado o duplo grau de jurisdição, a execução de uma condenação fica suspensa aguardando referendo da Suprema Corte”.

Somente em 2009 o STF, por uma decisão de 7 a 4, decidiu que a prisão após a condenação deixaria de ser regra, ao contrário do que dizia o CPP vigente à época. Foi nesse momento que a alegação de que a Constituição de 1988 proibia a prisão até o trânsito em julgado prevaleceu. A decisão se deu em um caso concreto de um rico fazendeiro de Passos, Minas Gerais, condenado por um Tribunal do Júri por tentativa de homicídio, em votação de um HC relatado por Eros Grau, que se posicionou favoravelmente à tese da defesa, de que a prisão só poderia acontecer após o trânsito em julgado. Votaram contra na época Menezes Direito, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e Ellen Gracie. 

Essa decisão do STF demorou 7 anos para ser revista, sendo que o próprio Gilmar Mendes, que em 2009 votou a favor, mudou seu voto, segundo ele, pelos efeitos perversos que decorreram da decisão. 

Assim, na verdade, a decisão de 2016 apenas retomou a jurisprudência do STF que havia antes da decisão de 2009.

PS: Tomada a decisão de 2009, de modo algo premonitório, o promotor de justiça de Minas Gerais, Marcelo Cunha de Araújo, comentou as consequências da decisão em seu livro, publicado já em 2009, com o título “Só é Preso Quem Quer! Impunidade e Ineficiência do Sistema Criminal Brasileiro”.

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