Essa polêmica está longe de ser a mais importante do debate “Bolsonaro x Haddad”. Mas ela é interessante para esclarecer o comportamento dos candidatos e a atuação da imprensa, em especial as tais “agências” de checagem dos fatos, no esclarecimento dos fatos.
Haddad afirma que o MEC nunca distribuiu “material impróprio para crianças de 6 anos”. Afirma ainda que se o MEC o fizesse, os professores e diretores não deixariam o material chegar até as crianças. Bolsonaro afirma que o kit existiu e que incluía o livro “Aparelho Sexual e Cia”, que promoveria uma "sexualização" precoce das crianças.
1) O que é fato
De fato houve a produção de um material pelo MEC associado ao projeto “Escola sem homofobia” para ser distribuído em 2011, ao custo de cerca de 2 milhões de reais. O material não foi distribuído pela pressão de deputados, principalmente das bancadas evangélicas e católicas. Diante da pressão, Dilma engavetou para sempre o material para “reavaliação”.
Dilma entrou em atrito com Haddad e tirou o poder o MEC de decidir sobre materiais desse tipo. Subordinou o controle dos materiais ao SECOM (aquele mesmo órgão do escândalo do uso de robôs pelo PT e PSDB).
Em 2015, o grupo LGBT que ajudou na elaboração do material o disponibilizou para download, juntamente com a revista Escola.
O material era composto de um caderno de orientação com mais de 120 páginas, 5 vídeos, 6 boletins (proposta de atividades com os alunos) e um cartaz.
O caderno e vídeos podem ser vistos aqui. Ver o material é a melhor maneira de cada um julgar por si mesmo. Os boletins não foram disponibilizados.
2) O que não é tão claro
A principal questão é a idade das crianças para o qual o material era destinado. O material se destinava ao ensino fundamental, que tem crianças de 6 a 14 anos. Bolsonaro argumenta que o material era para crianças a partir de 6 anos. Os defensores do “kit” afirmam que o material era para crianças mais velhas, a partir de 10 anos.
A agência “Aos Fatos” classificou como “fake” a afirmativa de que o material era para crianças a partir de 6 anos:
“o material não era destinado ‘a crianças de seis anos’, mas a estudantes do ensino médio, adolescentes e pré-adolescentes. Duas das peças audiovisuais contidas no projeto tinham classificação indicativa a partir de 11 anos, e uma era livre. Ainda assim, o caderno do Escola Sem Homofobia recomendava aos educadores ‘assistir/ouvir e verificar se o material é adequado à reflexão sobre o tema e a seu público’.
Não li todo o caderno “Escola sem Homofobia”. Uma pesquisa rápida parece não confirmar as alegações da agência. O caderno menciona que os assuntos relacionados “à cultura homofóbica” deveriam ser abordadas de forma transversal no ensino fundamental:
“Os temas transversais são conteúdos de caráter social que devem ser incluídos no currículo do Ensino Fundamental não como áreas de conhecimento específicas, mas como conteúdos a serem ministrados no interior das várias áreas definidas no próprio currículo”.
Já as dinâmicas (por dinâmicas entendo os boletins com propostas de discussões) deveriam ser abordadas “em especial” no ensino médio:
“Essas dinâmicas podem ser aplicadas à comunidade escolar e, em especial, a estudantes do ensino médio”.
A agência menciona três vídeos, mas eram de fato cinco vídeos. Um com indicação de dez anos (“Boneca na Mochila“), um com indicação de doze anos (“Medo de quê?“) e três com indicação livre (“Torpedo”, “Encontrando Bianca” e “Probabilidade”).
Mesmo com a ressalva de que o professor deveria “verificar se o material era adequado”, o fato é que três dos cinco vídeos possuíam indicação livre. Então acho sustentável o entendimento de Bolsonaro e dos críticos ao material de que ele poderia ser destinado a crianças a partir de seis anos.
Haddad, parece-me, tentou "tirar o corpo fora" diante da repercussão negativa. O material estava pronto para ser distribuído e só não o foi pela repercussão negativa e pela decisão de Dilma. O diretor da ONG que participou da elaboração do material, conforme reportagem do Jornal da Record de junho de 2011, afirmou que o material estava pronto para ser distribuído e Haddad sabia disso, tendo voltado atrás ("amarelado", segundo o diretor) após a pressão:
Haddad tenta ainda em suas declarações transferir para os professores a responsabilidade de não repassar aos alunos um material que teria a chancela do MEC.
É interessante discutir também as declarações de Dilma sobre o "kit". Ao ser entrevistada, declarou:
“Não vai ser permitido a nenhum órgão do governo fazer propaganda de opções sexuais. De nenhuma forma nós podemos interferir na vida privadas das pessoas. Agora o governo pode sim fazer uma educação de que é necessário respeitar diferenças e que você não pode exercer práticas violentas contra aqueles que são diferentes de você. Eu não concordo com o kit. Porque eu não acho que ele faça a defesa de práticas não homofóbicas”.
Quer dizer, Dilma entendeu que o "kit" estava fazendo mais propaganda de opções sexuais do que a defesa de práticas não homofóbicas.
Um exemplo que talvez sustente a opinião de Dilma está em um trecho do vídeo “Probabilidade”, sobre a bissexualidade: “gostando dos dois, a probabilidade de encontrar alguém por quem sentisse atração era quase cinquenta por cento maior, tinha duas vezes mais chance de encontrar alguém”.
O ponto principal é que o processo de desenvolvimento do material parece não ter tido uma preocupação maior de discussão com os professores e pais antes de sus distribuição. Aparentemente, o material só foi discutido dentro do MEC e com a ONG LGBT. Haddad deu atenção ao lobby desses grupos sem levar em conta a opinião da população que tem seus filhos nas escolas. É legítimo que grupos defendam seus interesses junto ao governo, do mesmo modo que é legítimo que deputados atuem de acordo com sua base eleitoral. É do jogo democrático. Faltou a Haddad uma atuação mais efetiva para achar um meio termo entre os interesses de grupos específicos e o da população em geral. Acredito que a imensa maioria da população não concordaria com a classificação etária dos vídeos feita pelo MEC e pela ONG. Mas, como eu disse, a melhor maneira é cada um julgar por si mesmo assistindo aos vídeos.
3) O que é “Fake”
Bolsonaro afirmou no Jornal Nacional que o livro “Aparelho Sexual e Cia” teria sido distribuído pelo MEC como parte do “Kit Gay” para crianças a partir de 6 anos quando Haddad era ministro da pasta. Diversas reportagens comprovaram que isso não é verdade.
Bolsonaro dificilmente desconhece o fato do "Kit" não conter livros. Posteriormente, em um live, ele comentou uma dessas reportagens, afirmando que o livro teria sido dado como brinde e que recebeu essa informação de uma diretora de escola. De forma indireta confessou que o livro não fazia parte do "kit". Sobre o fato da faixa etária do livro ser a partir da 6.a série, afirmou que o livro, ao ser disponibilizado para crianças dessa série, teria seu acesso facilitado a crianças a partir de 6 anos:
O livro mencionado por Bolsonaro foi comprado, em pequeno volume, para bibliotecas públicas (e não para escolas) e pelo Ministério da Cultura (e não pelo MEC).
O TSE mandou Bolsonaro retirar os vídeos que associam o livro “Aparelho Sexual e Cia” à Haddad.
Mas também é “Fake” a afirmação, repercutida por alguns blogs, de que a decisão do TSE confirmaria que o "kit" nunca existiu: o que a decisão indica é que o "kit" não incluía a distribuição de livros.
Haddad afirma que o MEC nunca distribuiu “material impróprio para crianças de 6 anos”. Afirma ainda que se o MEC o fizesse, os professores e diretores não deixariam o material chegar até as crianças. Bolsonaro afirma que o kit existiu e que incluía o livro “Aparelho Sexual e Cia”, que promoveria uma "sexualização" precoce das crianças.
1) O que é fato
De fato houve a produção de um material pelo MEC associado ao projeto “Escola sem homofobia” para ser distribuído em 2011, ao custo de cerca de 2 milhões de reais. O material não foi distribuído pela pressão de deputados, principalmente das bancadas evangélicas e católicas. Diante da pressão, Dilma engavetou para sempre o material para “reavaliação”.
Dilma entrou em atrito com Haddad e tirou o poder o MEC de decidir sobre materiais desse tipo. Subordinou o controle dos materiais ao SECOM (aquele mesmo órgão do escândalo do uso de robôs pelo PT e PSDB).
Em 2015, o grupo LGBT que ajudou na elaboração do material o disponibilizou para download, juntamente com a revista Escola.
O material era composto de um caderno de orientação com mais de 120 páginas, 5 vídeos, 6 boletins (proposta de atividades com os alunos) e um cartaz.
O caderno e vídeos podem ser vistos aqui. Ver o material é a melhor maneira de cada um julgar por si mesmo. Os boletins não foram disponibilizados.
2) O que não é tão claro
A principal questão é a idade das crianças para o qual o material era destinado. O material se destinava ao ensino fundamental, que tem crianças de 6 a 14 anos. Bolsonaro argumenta que o material era para crianças a partir de 6 anos. Os defensores do “kit” afirmam que o material era para crianças mais velhas, a partir de 10 anos.
A agência “Aos Fatos” classificou como “fake” a afirmativa de que o material era para crianças a partir de 6 anos:
“o material não era destinado ‘a crianças de seis anos’, mas a estudantes do ensino médio, adolescentes e pré-adolescentes. Duas das peças audiovisuais contidas no projeto tinham classificação indicativa a partir de 11 anos, e uma era livre. Ainda assim, o caderno do Escola Sem Homofobia recomendava aos educadores ‘assistir/ouvir e verificar se o material é adequado à reflexão sobre o tema e a seu público’.
Não li todo o caderno “Escola sem Homofobia”. Uma pesquisa rápida parece não confirmar as alegações da agência. O caderno menciona que os assuntos relacionados “à cultura homofóbica” deveriam ser abordadas de forma transversal no ensino fundamental:
“Os temas transversais são conteúdos de caráter social que devem ser incluídos no currículo do Ensino Fundamental não como áreas de conhecimento específicas, mas como conteúdos a serem ministrados no interior das várias áreas definidas no próprio currículo”.
Já as dinâmicas (por dinâmicas entendo os boletins com propostas de discussões) deveriam ser abordadas “em especial” no ensino médio:
“Essas dinâmicas podem ser aplicadas à comunidade escolar e, em especial, a estudantes do ensino médio”.
A agência menciona três vídeos, mas eram de fato cinco vídeos. Um com indicação de dez anos (“Boneca na Mochila“), um com indicação de doze anos (“Medo de quê?“) e três com indicação livre (“Torpedo”, “Encontrando Bianca” e “Probabilidade”).
Mesmo com a ressalva de que o professor deveria “verificar se o material era adequado”, o fato é que três dos cinco vídeos possuíam indicação livre. Então acho sustentável o entendimento de Bolsonaro e dos críticos ao material de que ele poderia ser destinado a crianças a partir de seis anos.
Haddad, parece-me, tentou "tirar o corpo fora" diante da repercussão negativa. O material estava pronto para ser distribuído e só não o foi pela repercussão negativa e pela decisão de Dilma. O diretor da ONG que participou da elaboração do material, conforme reportagem do Jornal da Record de junho de 2011, afirmou que o material estava pronto para ser distribuído e Haddad sabia disso, tendo voltado atrás ("amarelado", segundo o diretor) após a pressão:
Haddad tenta ainda em suas declarações transferir para os professores a responsabilidade de não repassar aos alunos um material que teria a chancela do MEC.
É interessante discutir também as declarações de Dilma sobre o "kit". Ao ser entrevistada, declarou:
“Não vai ser permitido a nenhum órgão do governo fazer propaganda de opções sexuais. De nenhuma forma nós podemos interferir na vida privadas das pessoas. Agora o governo pode sim fazer uma educação de que é necessário respeitar diferenças e que você não pode exercer práticas violentas contra aqueles que são diferentes de você. Eu não concordo com o kit. Porque eu não acho que ele faça a defesa de práticas não homofóbicas”.
Veja a reportagem completa aqui:
Quer dizer, Dilma entendeu que o "kit" estava fazendo mais propaganda de opções sexuais do que a defesa de práticas não homofóbicas.
Um exemplo que talvez sustente a opinião de Dilma está em um trecho do vídeo “Probabilidade”, sobre a bissexualidade: “gostando dos dois, a probabilidade de encontrar alguém por quem sentisse atração era quase cinquenta por cento maior, tinha duas vezes mais chance de encontrar alguém”.
O ponto principal é que o processo de desenvolvimento do material parece não ter tido uma preocupação maior de discussão com os professores e pais antes de sus distribuição. Aparentemente, o material só foi discutido dentro do MEC e com a ONG LGBT. Haddad deu atenção ao lobby desses grupos sem levar em conta a opinião da população que tem seus filhos nas escolas. É legítimo que grupos defendam seus interesses junto ao governo, do mesmo modo que é legítimo que deputados atuem de acordo com sua base eleitoral. É do jogo democrático. Faltou a Haddad uma atuação mais efetiva para achar um meio termo entre os interesses de grupos específicos e o da população em geral. Acredito que a imensa maioria da população não concordaria com a classificação etária dos vídeos feita pelo MEC e pela ONG. Mas, como eu disse, a melhor maneira é cada um julgar por si mesmo assistindo aos vídeos.
3) O que é “Fake”
Bolsonaro afirmou no Jornal Nacional que o livro “Aparelho Sexual e Cia” teria sido distribuído pelo MEC como parte do “Kit Gay” para crianças a partir de 6 anos quando Haddad era ministro da pasta. Diversas reportagens comprovaram que isso não é verdade.
Bolsonaro dificilmente desconhece o fato do "Kit" não conter livros. Posteriormente, em um live, ele comentou uma dessas reportagens, afirmando que o livro teria sido dado como brinde e que recebeu essa informação de uma diretora de escola. De forma indireta confessou que o livro não fazia parte do "kit". Sobre o fato da faixa etária do livro ser a partir da 6.a série, afirmou que o livro, ao ser disponibilizado para crianças dessa série, teria seu acesso facilitado a crianças a partir de 6 anos:
O livro mencionado por Bolsonaro foi comprado, em pequeno volume, para bibliotecas públicas (e não para escolas) e pelo Ministério da Cultura (e não pelo MEC).
O TSE mandou Bolsonaro retirar os vídeos que associam o livro “Aparelho Sexual e Cia” à Haddad.
Mas também é “Fake” a afirmação, repercutida por alguns blogs, de que a decisão do TSE confirmaria que o "kit" nunca existiu: o que a decisão indica é que o "kit" não incluía a distribuição de livros.
De qualquer maneira a questão tinha que ser amplamente discutida, com professores, pais, orientadores e pedagogos. Não poderiam simplesmente distribuir nas escolas e deixar por responsabilidade dos professores. Não queria hj que nenhum dos meus filhos tivessem acesso a este tipo de material, uma menina de 9 e um menino de 5. Acredito que não é a hora ainda.
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